"Rallies, touradas, bailes de gala, beija-mão
ao bispo na bênção das pastas – tudo acompanhado pelas autoridades
académicas muito contentes com a “irreverência” dos “seus” jovens, quando ela
se manifestava naquelas formas – eram muito mais uma introdução à disciplina do
que o despertar de qualquer consciência crítica. No fundo, o que se pretendia
era que houvesse uma “explosão” de inanidades, a que depois se seguiria a
disciplina da vida adulta, casamento, emprego, família e filhos, ordem social e
hierarquia." J.P. PEREIRA PÚBLICO
"(...) corre por aí que essa personagem sofre de uma “amnésica
selectiva” e que nenhum aluno da Lusófona revelou ainda à polícia as regras
secretas da “praxe” local (“Grande Conselho” incluído). Pior do que isso, na
Internet já apareceram ameaças a quem “falar”, tal e qual como na máfia." V.P. VALENTE http://www.publico.pt/sociedade/noticia/praxes-igual-a-mafia-1620969 PÚBLICO
“Ando aqui com esta merda entalada há já algum tempo. A ouvir as
diferentes versões, a pensar nas dúvidas e a pôr-me no lugar das pessoas. Tento
pôr-me no lugar dos pais dos teus colegas que morreram. Mas não quero. É um
lugar que não quero nem imaginar. É um lugar que imagino ser escuro e vazio. Um
vazio que nunca mais será preenchido. Nunca mais, Dux. Sabes o que é isso?
Sabes o que é “nunca mais”?
A história que te recusas a contar cheira cada vez mais a merda,
Dux. Primeiro não falavas porque estavas traumatizado e em choque por perderes
os teus colegas. Até acredito que estivesses. Agora parece que tens amnésia
selectiva. É uma amnésia conveniente, Dux. Se calhar não sabias. Ou então andas
a ver se isto passa.
Mas isto não é uma simples dor de cabeça, Dux. Isto não vai lá
com o tempo nem com uma aspirina. Já passou mais de 1 mês. Continuas calado.
Mas os pais dos teus colegas têm todo o tempo do mundo para saber a verdade,
Dux. E vão esperar e lutar e espremer e gritar até saberem. Porque tu não tens
filhos, Dux. Não sabes do que um pai ou uma mãe é capaz de fazer por um filho.
Até onde são capazes de ir. Até quando são capazes de esperar.
Vocês, Dux… Vocês e os vossos ridículos pactos de silêncio.
Vocês e as vossas praxes da treta. Vocês e a mania que são uns mauzões. Que
preparam as pessoas para a vida e para a realidade à base da humilhação, da
violência e da tirania. Vou te ensinar uma coisa, Dux. Que se calhar já vai
tarde. Mas o que prepara as pessoas para a vida é o amor, a fraternidade, a
solidariedade e o civismo. O respeito. A dignidade humana e a auto-estima. Isso
é que prepara as pessoas para a vida, Dux. Não é a destruí-las, Dux. É ao contrário.
É a reforçá-las.
Transtorna-me saber que 6 colegas teus morreram, Dux. Também te
deve transtornar a ti. Acredito. Mas devias ter pensado nisso antes. Tu que és
o manda-chuva, e eles também, que possivelmente se deixaram ir na conversa.
Tinham idade para saber mais.
Meco à noite, no Inverno, na maior ondulação dos últimos anos,
com alerta vermelho para a costa portuguesa? Achavam mesmo que era sítio para
se brincar às praxes, Dux? Ou para preparar as pessoas para a vida? Vocês são
navy seals, Dux? Estavam a preparar-se para alguma missão na Síria? Enfim.
Agora sê homenzinho, Dux. E fala. Vá. És tão dux para umas
coisas e agora encolhes-te como um rato. Sabes o que significa dux, Dux?
Significa líder em latim. Foste um líder, Dux, foste?
Líderes não humilham colegas. Líderes não “empurram” colegas
para a morte. Líderes lideram por exemplo. Dão o peito e a cara pelos colegas.
Isso é um líder, Dux.
Não sei o que isto vai dar, Dux. Não sei até que ponto vai a tua
responsabilidade nesta história toda. Mas a forma como a justiça actua neste
país pequenino não faz vislumbrar grande justiça.
És capaz de te safar de qualquer responsabilidade, qualquer que
ela seja. Espero enganar-me. Vamos ver.
O que eu sei é que os pais que perderam os filhos precisam de
saber o que aconteceu. Precisam mesmo, Dux. É um direito que eles têm. É uma
vontade que eles precisam. Negá-los disso, para mim já é um crime, Dux. Um
crime contra a humanidade. Uma violação dos direitos humanos fundamentais.
Só por isso Dux, já devias ser responsabilizado. É tortura, Dux.
E a tortura é crime. Sabes, quero me lembrar de ti para o resto da vida, Dux.
Sabes porquê? Porque não quero que o meu filho cresça e se torne num dux. Quero
que ele seja o oposto de ti. Quero que ele seja um líder e não um dux.
Consegues perceber o que digo, Dux? Quero que ele respeite todos e todas. Que
ele lidere por exemplo. Que ele não humilhe ninguém. Que seja responsável. Que
se chegue à frente sempre que tenha que assumir responsabilidades. Que seja
corajoso e não um rato nem um cobardezinho. Que seja prudente e inteligente.
E quero me lembrar também dos teus colegas que morreram. Porque
não quero que o meu filho se deixe “mandar” e humilhar por duxezinhos como tu.
Não quero que ele se acobarde nem se encolha perante nenhum duxezinho. Quero
que ele saiba dizer “não” quando “não” é a resposta certa. Quando “não” pode
salvar a sua dignidade, o seu orgulho ou até a sua vida.
Quero que ele saiba dizer “basta” de cabeça erguida e peito
cheio perante um duxezinho, um patrãozinho, um governozinho ou qualquer tirano
mandão e inseguro que lhe apareça à frente. É isso que eu quero, Dux.
Quem o vai preparar para a vida sou eu e a mãe dele, Dux. Não é
nenhum dux nem nenhuma comissão de praxes. Sabes porquê, Dux? Porque eu não
quero um dia estar à espera de respostas de um cobarde com amnésia selectiva.
Não quero nunca sentir o vazio dos pais dos teus colegas.
Porque quero abraçar o meu filho todos os dias da minha vida até
eu morrer, Dux. Percebeste? Até EU morrer. EU, Dux. Não ele”. aqui