segunda-feira, 8 de junho de 2020

Churchill: o Outro Lado Também Existiu



No Público 

"Churchill “era racista”?

No caso de Churchill (1874-1965), é antigo o debate sobre o balanço das contradições entre a sua maior batalha, o seu legado como “libertador” da Europa e herói antifascista e o seu quadro de valores humanos e sociais. Muito por causa das declarações discriminatórias e xenófobas que fez, na sua época, sobre indianos, palestinianos, sudaneses, australianos ou indígenas norte-americanos. 
Em 1937, por exemplo, tomou esta posição: “Não admito que se tenha feito um mal assim tão grande aos índios vermelhos da América ou às populações negras da Austrália. Não admito que se tenha feito mal a estas pessoas pelo facto de uma raça mais forte, uma raça de grau superior, uma raça mais mundana, por assim dizer, ter chegado e tomado o seu lugar”, disse Churchill numa comissão sobre a Palestinacitado pela BBC.



“Não percebo as reticências sobre o uso de gás. Sou firmemente a favor do uso de gás venenoso contra tribos incivilizadas”, defendeu anos antes, em 1919, num memorando, referindo-se às populações curdas e iraquianas que resistiam à ocupação britânica depois da queda do Império Otomano.
Pelo meio, houve mais declarações controversas. Como a sugestão de que a grande fome de 1943 na Índia britânica, se deveu ao facto de os indianos “se reproduzirem como coelhos”, o rótulo de “selvagens” colocado nos rebeldes sudaneses que se insurgiram contra o Império ou a descrição dos palestinianos, em 1930, como “hordas bárbaras que não comem mais do que estrume de camelo”.



O homem que fez frente a Adolf Hitler e ao fascismo era racista? “Winston Churchill era racista, mas ainda assim era um grande homem”, respondeu desta forma, há mais de um ano, o membro da Câmara dos Lordes, pelo Partido Conservador, e ex-director executivo do Times, Daniel Finkelstein. “Sim, Churchill era racista. Mas é apenas uma parte da verdade sobre este homem politicamente complexo”, escreveu esta segunda-feira, por seu lado, o editor-adjunto do Independentsite noticioso de esquerda, Sean O’Grady.

A queda de Colston 

Mesmo tendo o racismo e o passado imperial britânico como focos, o episódio de Bristol, motivou, ainda assim, um debate de natureza diferente, por ter um elemento de eliminação de propriedade pública por decisão – e mão – de um grupo popular específico.
Desde o primeiro-ministro, Boris Johnson, passando pelo líder da oposição, Keir Starmer, ou pelas autoridades locais, praticamente todos concordaram que a forma como a estátua de Edward Colston foi derrubada e atirada à água foi “errada” e até “criminosa”, por não ter sido o resultado de um processo aprovado democraticamente.



Mas entre os detentores de cargos públicos, há quem compreenda os motivos pelos quais se derrubou a estátua de um homem que comercializou cerca de 80 mil vidas humanas, entre Reino Unido, África e América, e cujo nome é famoso em Bristol, em grande medida, por causa das enormes quantias de dinheiro que deixou à cidade aquando da sua morte, em 1721.




“Tenho ascendência jamaicana e não posso fingir que tive qualquer tipo de sentimento de perda pela estátua, tal como não posso fingir que a sua existência, no meio de Bristol, a cidade onde cresci, me fazia sentir algo de diferente do que uma afronta pessoal”, admitiu o presidente da câmara, Marvin Rees.
“Embora desapontado por ver as pessoas danificarem uma das nossas estátuas, compreendo porque é que o fizeram. É bastante simbólico”, acrescentou o chefe da polícia local, Andy Bennett.  



Na sua intervenção no Parlamento, esta segunda-feira, a ministra do Interior, Priti Patel, destacou as 135 pessoas detidas em todo o país, por causa de desacatos e confrontos com a polícia, para condenar a “minoria” de manifestantes que “destruiu propriedade privada”. 
Ao mesmo tempo, lembrou que, também ela – de ascendência paquistanesa –, sofreu racismo na pele e que, por isso, “não recebe lições” da oposição sobre o tema. E prometeu “justiça""

Yes, indeed.

"Edward Colston was responsible for 100,000 people being moved from Africa to the Caribbean as slaves. 20,000 died en route.

The statue shouldn't have been taken down in the way it was. But it should have been removed from our streets a long time ago."

Keir Sterman

Memória

Algo sobre a memória que deixamos aos outros quando  partimos de nós próprios e dos outros também.
Para os que não acreditam que a vida é uma passagem para outras vidas (?), nesta morte de que ninguém escapa (o único ponto em que todos, sem excepção, acreditamos por igual: ninguém é físicamente eterno), a memória é sumamente importante: ela, através de obras criativas que tenhamos deixado, ou através dos que amámos e nos amaram, do que deixámos neles e o que deles levámos, através do que pensámos, agimos, beijámos, fizemos ou omitimos, ou frustrámos, ou iludimos ou desiludimos, ou composemos, ou desfizemos, ela, a memória de cada um de nós é a vida, a única vida que deixamos quando morremos, ela, e só ela, a vida que levamos connosco e sempre deixamos quando nos vamos, ela, a memória, é o património real do que fomos e do que realizámos.
E isso só morre, e definitivamente nós com ela, quando a última pessoa que se recordar, amar, odiar, sentir algo por nós, morrer ela própria também, por fim.
Aí, sim, morremos de verdade. 

Maomé e Yourcenar...

Morre em Medina, no dia 8 de Junho de 632, o filho de Allah (também era pai?...) e nasce em 8 de Junho de 1903 Marguerite Yourcenar....
Assim,

"Para os muçulmanos, Jesus anunciou a vinda de Maomé" aqui


Afinal tão distantes e na génese, nos fundamentos monoteístas (embora se excluam mutuamente como heréticos..."O meu Deus é o único verdadeiro!" ) e nas práticas (os Huguenotes do século XVI podem bem ser os Sunitas em terra Chiita - ou vice-versa pois são comutativos-; os Anglo-Protestantes Irlandeses em terra Católica - ou vice-versa pois também são comutativos), muito antigas, antigas, modernas e muito modernas, e afinal tão aproximados, dependendo bastante da perspectiva de todos e de todos os outros que vêem (ou não) de fora.
(voltarei a estes temas noutra ocasião...)
E:

 o melhor livro estrangeiro que li, uma relíquia, uma delícia, sublime, exquise...
de uma belga francófona, quase aristocrata na sua quase forma de estar mas da realeza da escrita. 
Marguerite Yourcenar (anagrama de Crayencour) era o pseudónimo de
Marguerite Antoinette Jeanne Marie Ghislaine Cleenewerck de Crayencour.

"Memórias de Adriano (em francêsMémoires d'Hadrien), um romance que é uma autobiografia imaginária sobre a vida e a morte do imperador romano Adriano. Memórias de Adriano foi publicado pela primeira vez em França em 1951, com enorme sucesso. Adriano foi, ele próprio, autor de uma auto-biografia que, no entanto, não chegou aos nossos dias.
O livro está organizado em seis partes, incluindo um prólogo e um epílogo: “Animula vagula blandula”, “Varius multiplex multiformis”, “Tellus satabilita”, “Saeculum aureum”, “Disciplina augusta” e “Patientia”. Toma a forma de uma carta redigida por Adriano e dirigida ao seu filho adoptivo e futuro imperador Marco Aurélio, então com dezassete anos[1].
Marguerite Yourcenar referiu no posfácio, "Carnet de note", à edição inicial, que havia escolhido Adriano como tema para o seu romance em parte porque este tinha vivido numa época intercalar, em que já não se acreditava nos deuses romanos mas em que o Cristianismo ainda não se tinha firmado, o que lhe despertou curiosidade porque ela própria viveu uma época semelhante na Europa do pós-guerra."