Escandinávia, camisola amarela utópica
Cresce um
movimento de boicote às viagens de avião por tudo o que elas representam na
massificação e destruição de uma certa maneira de estar e viver. Com o slow
food, as viagens e os retiros espirituais. As emissões de CO2 muito contribuem para isso. Essas
pessoas incentivam-se (e a outros) para viajarem mais de comboio, barcos e até
cargueiros. As modas são algo que detesto profundamente e esta parece-me mais
uma a juntar a uma multiplicação diabólica delas, muito impulsionadas pelas
“redes”sociais”.
A ideia de
poluir menos, de ter comportamentos mais racionais e exequíveis (menor gasto de
água, maior exigência com o meu ambiente que nos rodeia e nos faz viver), só
pode ser naturalmente aceite e, se possível, concretizada. Mas estes movimentos
quase sempre maximalistas, fazem imaginar modos de pensar que parecem obedecer
a comandos vanguardistas que, esgotada uma convulsão, logo estarão na primeira
linha de outra.
Como já referi, o turismo de massas está a destruir o turismo como conhecimento e fruição de todos os outros mundos diferentes dos nossos (e como há mundos opostos e inconciliáveis no interior mesmo de “cada mundo”!…). É uma verdade de Lapalisse já conhecida nas últimas décadas mas que aumentou exponencialmente com a baixa generalizada das tarifas aéreas e do aumento de nível de vida de fatias grandes da população. Há 30 anos eram poucos os chineses da China Continental que viajavam: as reformas de Deng Xiaoping estavam nas auroras do experimentalismo do colectivismo atávico. Volvidas poucas décadas os chineses de Xi Jinping já dominam o mundo e a exploração turística. E, não sem mágoa, continuarão cada vez mais. Do exposto não se deve retirar nenhuma conclusão de animosidade especial para com estes asiáticos. Dos outrora europeus (os norte-americanos continuam a não ser muito curiosos de outras manteigas que não a de amendoim…) aos japoneses e outros poucos, a diversificação da origem dos turistas também é grande.
Como já referi, o turismo de massas está a destruir o turismo como conhecimento e fruição de todos os outros mundos diferentes dos nossos (e como há mundos opostos e inconciliáveis no interior mesmo de “cada mundo”!…). É uma verdade de Lapalisse já conhecida nas últimas décadas mas que aumentou exponencialmente com a baixa generalizada das tarifas aéreas e do aumento de nível de vida de fatias grandes da população. Há 30 anos eram poucos os chineses da China Continental que viajavam: as reformas de Deng Xiaoping estavam nas auroras do experimentalismo do colectivismo atávico. Volvidas poucas décadas os chineses de Xi Jinping já dominam o mundo e a exploração turística. E, não sem mágoa, continuarão cada vez mais. Do exposto não se deve retirar nenhuma conclusão de animosidade especial para com estes asiáticos. Dos outrora europeus (os norte-americanos continuam a não ser muito curiosos de outras manteigas que não a de amendoim…) aos japoneses e outros poucos, a diversificação da origem dos turistas também é grande.
O que aflige,
e já havia bastos exemplos disso no passado, é o modo como a grande maioria das
pessoas viaja: procuram o mesmo tipo de prazer, ou muito parecido, que tiram da
vida quando não estão a fazer de turistas: passam dias ou semanas em cruzeiros
com condomínios de luxo, comem, nadam, descansam e saboreiam o tempo, sem nada
que os estimule a conhecer o que quer que seja dos outros mundos, saem nas
cidades, deslocam-se em manada, compram recordações, acotovelam-se nas filas
para os monumentos, e acham tudo “very tipical”. O mesmo para as excursões
organizadas onde se “vê” uma cidade numa tarde, uma vila noutra, um des(en)graçado
fado numa noite ou essa beleza da irracionalidade humana que é o evento onde se
espetam farpas em animais, à vista e ao aplauso entusiástico dos assistentes,
sabendo que o bicho é morto depois para não ferir susceptibilidades, principalmente
das crianças. Ou ainda para os resort de
abundância ou aparentado onde o navio é em terra mas os marinheiros são mão de
obra barata e sazonal, e onde os viajantes ficam a conhecer muito bem os grãos
de areia, infelizmente não todos, que banham a praia em frente ao cercado, ou à
volta das sempiternas piscinas, tudo isto mesmo não sendo na zona do Club Méditerranée.
Os mesmos gelados, o mesmo tipo de animação, talvez agora também um pouco mais
abertos ao turismo da natureza, mesmo que seja para ver pavões num jardim
liofilizado. E as cidades? Que beleza e gosto de entrar numa Versace
em Paris, que é completamente diferente da Versace de Tóquio e, para não
destoar, ainda mais diferente da recentemente aberta na Cidade do Cabo. Ou Louis
Vuitton, ou l’Oreal, ou Adidas, ou, ou, ou…(tenho desculpa
de não saber mais mas, se fosse outro, faria uma acção de formação em marcas
genuínas). Um café no Starbucks de Hanói muito diferente
de outro em Lima. Ou em Oslo. E aí por diante.
Do exposto
parece nutrir-se ódio a essas formas de viver. Não. Só comichão esbracejado,
curado com aceitação plena das mesmas. Mas não, obrigado.
Quer isto
dizer que só fazemos um tipo de turismo que fomos construindo desde a primeira
viagem a Milão em 1978? Sim. Mas não foi possível, nem o quisemos, fugir
a tudo. Até comemos hamburguers em MacDonald’s, mesmo em Riga
ou em Swapamund.
O que é o
nosso tipo de fazer turismo ( sendo claro que não somos autóctones dos países
por onde passamos). Procuramos sempre não ir à espera de encontrar o que
queremos, inconscientemente, encontrar. Viver o mais possível junto às pessoas,
observar como se comportam, como se vestem, como são na sua maioria e
descortinar, às vezes, variantes que pensamos incomuns à generalidade daquelas
pessoas. Provavelmente errando. Queremos genuinamente tentar perceber como as
pessoas vivem: se saem do escritório e ali mesmo, no canto do jardim, em Saigão,
exercitam a meditação durante algum tempo e depois pegam na mala e desaparecem
na multidão, ou se pescam nas margens de um rio indiano, em Agra,
peixes desconhecidos, ou se vendem gelados numa praia de Goa, ou se trocam
guturais sons em mercados livres de rua em Tallin, ou Vasta.
Provavelmente
não entendendo nada, dada a nossa terrível falta de espiritualidade, percorrer
o bairro copta e as suas igrejas numa parte menos apertada do Cairo,
assistir subrepticiamente a uma oração muçulmana na Mesquita Azul de Istambul,
assistir com alguma impressividade a um cortejo de purificação através do sacrifício
de animais, nas bordas de um riacho não longe de Katmandu, apreciar o
enlevo e o carinho com que os cemitérios por toda a Lituânia os cristãos
ortodoxos exibem, observar os comportamentos de norte-americanos comuns ao
assistirem, com pipocas a cavalo, a um espectáculo de crocodilos na Disneylândia
de Los
Angeles (cedência natural à
pequenita de 5 anos na altura que não parece ter deixado marcas; com a retrospectiva
pena de não termos visitado a Universal Pictures, ali quase ao
lado); ou o arroz especialmente feito pelo sr Carlos em Pagim, Goa,
ignominiosamente esquecido por se ter perdido o endereço; ou a montanha russa
da bela San Francisco; ou a descida de cerca de 15 km, árida, estafante
mas única, como no desfiladeiro de Samaria, em Creta; ou a viagem
de moto-táxi na impressiva multidão moteira de Hanói; ou as
chaminés-de-fada da Anatólia Central, ou as formações calcárias de Pamukalle;
ou os sombrios templos de Angkor e da zelosa varredora do pó
da floresta densa próxima; ou ouvir a conversa formal numa padaria de Besançon
ou Paris; ou uma missa na Catedrale de Notre Dame ainda não
devorada; ou nas maravilhosas luzes solares nas Ilhas Lofoten, já a norte
do círculo polar árctico; ou as brincadeiras de elefantes-bebés no maravilhoso
mundo de Etosha namibiano; ou muitas, muitas outras sensações e viveres.
Mas viajar
sempre que possível nos transportes dos locais, comunicar com as pessoas ou
entender o que se vai passando à nossa volta tem uma acre e desgostosa
imponderabilidade: só percebendo a língua falada ou escrita, ou encontrar um
interlocutor que fale uma língua moderadamente comum, se consegue algo. E
existe essa sensação de termos compreendido muito pouco ou só a
superficialidade das coisas, excepto no segundo país hispanófono que visitámos,
Costa
Rica, em Itália, em França, no Canadá (Québec).
Que pena não
saber vietnamita, turco, holandês, grego, árabe, kmer, sueco, lituano, swaali,
letão, alemão, gaélico irlandês e gaélico escocês, estónio, norueguês, basco, hebreu
e hindi. Teria aprendido muito mais do mundo. E o meu livro teria mais
páginas com vida.
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